“O 3D nunca irá salvar um filme sem qualidade”

10Jun10

A era digital nem sempre é vista com bons olhos. Avatar foi um desafio das novas tecnologias e foi um sucesso, mas as opiniões são mais que muitas e bastante divididas. Muitos desconhecem, mas a verdade é que o 3D ainda tem pontos fracos.

Avatar estreou a 18 de Dezembro de 2009 nas salas portuguesas e já deu muito que falar, aqui e em todo o mundo. Vencedor de dois globos de ouro, o filme já é tema de conversa em todas as esquinas. O 3D é o ângulo mais abordado e as opiniões distinguem-se.

A película conta a história de Jake Sully (Sam Worthington), um veterano de guerra paraplégico, que é levado para uma missão a Pandora, um planeta habitado pelos Na’vi, uma raça humanóide que possui cultura e idioma próprios. Para entrar no planeta, os humanos criam avatares, seres híbridos com DNA Na´vi. A história centra-se em Jake e o encontro com esses seres mudará a sua vida para sempre.

Avatar foi filmado em 3D, com os actores a serem transformados em versões digitais pela captura de movimento. Cortar e montar. Analógico ou digital. Linear ou não – linear. Editar um filme não se baseia apenas em escolher as melhores cenas. É nesta fase que são inseridos os efeitos especiais, as trilhas sonoras, as legendas e onde se inserem também os efeitos de áudio.

Os efeitos especiais possuem várias etapas. João Pedro Jorge, engenheiro de software participou nestas diferentes fases do Avatar. “Em geral, o processo começa com a geração de modelos 3D que representam objectos ou criaturas na cena. Depois são gerados esqueletos para que os animadores lhes dêem vida. São também geradas texturas e criados os ‘modelos’ necessários para que esses modelos pareçam o mais real possível”, começa por decifrar o engenheiro. Para interagir com os modelos 3D são criadas diferentes simulações, como o fumo, as explosões, a água, entre outros. “No final são geradas as imagens através de uma aplicação chamada ‘renderer’, e outros colegas, os ‘compositors’, juntam-nas e produzem o resultado final”, conclui João Jorge. Imagem de duas dimensões elaboradas de forma a proporcionarem a ilusão de terem três dimensões, assim se define o 3D. Mas o engenheiro, completa: “ No cinema o termo 3D é uma maneira de denominar a visão estereoscópica, ou seja, a noção de profundidade”.

Muitos dizem que são os efeitos especiais que levam a população às salas de cinema, mas há quem contraponha. Luís Cardoso, professor de cinema na Escola Superior de Educação de Portalegre defende que: “O público é heterogéneo, o que significa que a pluralidade é uma das suas características. Os efeitos especiais conseguem atrair muita gente (Avatar, Matrix, O Senhor dos Anéis…) mas há inúmeros filmes sem essa dimensão muito vincada que também conseguem atrair espectadores”.

As opiniões dividem-se quando se aborda os filmes em 3D. Para uns, os filmes em 3D são os preferidos. Mas para outros, a visão de profundidade pode tornar-se cansativa. Tripp Hudson, produtor de efeitos de especiais do filme sustenta que: “Depende realmente do filme. Eu adoro o Avatar, o 3D funciona lindamente. Mas ele não funciona em todos os filmes. É de salientar que quase todos os filmes animados são realizados em 3D agora.”

As três dimensões levam muitos jovens e adultos às salas de cinema. Para o professor de cinema, “o desejo de comunhão e integração espacial na diegese, nomeadamente no espaço e na aproximação às experiências das personagens e intenções narrativas”, faz-lhe optar pelo grande ecrã, quando se tratam de filmes com efeitos especiais a três dimensões.

O 3D resulta da utilização de tecnologia que cria uma ilusão de profundidade, de uma terceira dimensão espacial. Possui inúmeras potencialidades mas as dificuldades técnicas e financeiras do processo não têm ajudado à sua proliferação. Avatar esperou 15 anos para poder ser concretizado. James Cameron pensou na história em 1995, mas só retomou o projecto há quatro anos, quando tinha todas as ferramentas tecnológicas para o concretizar. Uma das novas técnicas utilizadas é o reconhecimento facial, que capta, em computador, as expressões dos actores, incluindo o movimento dos olhos, para posterior reprodução em animação.

Tripp Hudson participou na produção dos efeitos especiais de Avatar e consegue descrever em breves palavras este filme. “Uma história bonita, com imagens incríveis e onde as pessoas se podem relacionar”. E afirma ainda com firmeza: “O público adora este filme.”

Para alguns produtores , o 3D é visto como um processo para travar a pirataria. Gaspar Garção, crítico de cinema em Portalegre comenta que: “o 3D poderá ser uma forma de travar a pirataria, juntamente com o cinema projectado em formato digital e o envio de filmes directamente das produtoras para os cinemas através da internet, mas é óbvio que a pirataria não irá desaparecer, a não ser que sejam tomadas pelas autoridades medidas mais drásticas.
No entanto, para quem aprecia o cinema “verdadeiramente”, é obviamente uma mais valia.  Apesar do fenómeno “Avatar”, penso que o 3D nunca irá salvar um filme sem qualidade, nem alterar o decréscimo global na venda de bilhetes e dvd’s.”

A produção de «Avatar» lançou um vídeo onde explica a criação do planeta Pandora e a sua história, a partir da narração de Sigourney Weaver, que, no filme, interpreta a Drª Grace Augustine, uma cientista que dedicou a sua vida àquele planeta.

Pandora é um lugar tratado como o paraíso. Coberto de cores claras a desvanecer a cada minuto. Onde a aventura e a emoção se entrelaçam com a magia da fantasia. O empenho de James Cameron para criar um universo alienígena foi vencido. As plantas e os animais são completamente diferentes do que vimos em filmes do género e a floresta tropical de Pandora é um espaço físico hostil e deslumbrante que dá vontade de descobrir. Recheada de mistérios e detalhes por explorar, Pandora é palco de um romance entre dois Na’vis.

Maria do Carmo Piçarra é crítica de cinema e descreve o sucesso em breves linhas, com um diferente e complexo ângulo de abordagem. “É um filme pós-era Bush, em que a suspeição pelo estrangeiro, pelo ‘outro’ e o belicismo se impuseram aos Direitos do Homem, e assinala as expectativas num maior humanismo com a ‘Política da Esperança’, triunfadora com a eleição de Obama como presidente do país mais poderoso do mundo”. E acrescenta: “Fá-lo pela crítica à opção num Estado de desconfiança, em que o investimento no armamento e defesa supera o investimento na preservação ambiental. Nisso radica a crítica aos habitantes do Planeta Terra, que destroem o seu habitat, abstraindo-se de um necessário equilíbrio natural.”

Avatar é já um sucesso de bilheteiras em todo o mundo. Com ou sem óculos especiais, muitos pés correm às salas escuras e ocupam o seu lugar para assistir de braços descontraídos à aventura dos Na’vis.

“No filme “Avatar”, consegui ‘imergir-me’ completamente numa história, uma espécie de simulacro de Realidade Virtual, como nos jogos de computador, mas claro que com um nível técnico e de efeitos especiais muito maior,” confessa Gaspar Garção. E vai mais longe: “Costuma-se dizer que o cinema é um escape para a realidade, e no caso deste filme parece que até os próprios espectadores estão a sofrer de um ‘síndroma’ de dependência dos efeitos em 3D: muitos mencionaram que gostariam de viver em Pandora, por ser muito mais interessante e muito mais real que o mundo onde vivem.”

A câmara encerra quando Neytiri remove a máscara de Jake, no rosto humano. Ela gentilmente fecha os olhos mortos com os seus dedos. Então, inclina-se e beija. Movimento em ‘closed up’ no Avatar de Jake com a mão de Neytiri acariciando o seu rosto. Mantenha o ritmo, então. Eles abrem. Corta para preto.

(Um artigo escrito para uma disciplina de mestrado)



1 Responses to ““O 3D nunca irá salvar um filme sem qualidade””

  1. Cara Susana, lamento que após o meu contributo não tenha tido a disponibilidade para, tal como lhe pedi, enviar-me uma cópia do seu trabalho sobre o qual, naturalmente, fiquei com curiosidade.


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